A busca pela música viral está mudando a forma como os artistas criam, se promovem e até mesmo como se relacionam com sua própria arte. Mas será que essa corrida pela atenção está beneficiando a música — ou destruindo sua essência?
Por que a música viral virou o novo padrão?
A indústria musical sempre perseguiu o sucesso, mas os mecanismos que definem esse sucesso mudaram drasticamente. Antes, eram os A\&Rs, os críticos especializados e os DJs que decidiam o que chegaria aos ouvidos do grande público. Hoje, o algoritmo manda — e ele valoriza músicas que funcionam em 15 segundos, não em três minutos.
Isso faz com que muitos artistas priorizem ganchos simples, refrões repetitivos e batidas “TikTokáveis”, em vez de construirem canções com profundidade e intenção. O foco deixa de ser emoção e passa a ser engajamento. E esse modelo, embora gere números rápidos, não construiu carreiras rigorosas.
A divisão criativa: entre arte e performance
O resultado? Uma bifurcação no processo criativo. Muitos músicos hoje se veem obrigados a criar dois tipos de conteúdo: um comercial e viral para “pagar as contas” e outro mais autêntico para alimentar sua identidade artística. Isso pode parecer uma boa estratégia de sobrevivência — e talvez seja —, mas também indica uma crise silenciosa na essência da criação musical.
Inclusive, gêneros tidos como “puros”, como o techno, já enfrentam um questionamento interno: é música de pista ou só mais um loop que vai estourar no Reels? O “techno do TikTok” é um exemplo claro de como até as cenas underground estão sendo absorvidas pelo algoritmo.
O custo cultural da música viral
Esse cenário levanta uma preocupação maior: o que acontece com a cultura quando a arte vira apenas pano de fundo para vídeos? Quando a música deixa de ser protagonista e se transforma em trilha sonora definitiva, perdemos o poder transformador da arte. A música sempre foi um veículo de identidade, crítica, celebração e emoção. Mas quando tudo precisa ser editável, reciclável e viralizável, o valor simbólico se esvaziar.
Música viral e engenharia reversa da criação
Isso não significa que não existam músicas excelentes que viralizaram. Mas há uma diferença importante entre viralizar a forma orgânica e criar uma música apenas com esse objetivo. Quando os artistas começam a fazer “engenharia reversa” para atender ao algoritmo — ao invés de partirem de uma visão criativa genuína —, o risco cultural é alto. A arte deixa de guiar a tecnologia e passa a ser moldada por ela.
O público também tem um papel nesse processo. Embora a maioria dos ouvintes apenas consuma o que aparece nos feeds, há uma necessidade urgente de escolhas mais conscientes. Quando os artistas percebem que há espaço para profundidade e profundidade, sentem-se mais encorajados a manter sua essência. Do outro lado, plataformas e gravadoras precisam rever seu papel, deixando de tratar o artista como fornecedor de clipes virais e passando a vê-lo como criador de obras culturais relevantes.
E daqui a cinco anos?
A pergunta que precisa ser feita não é “isso vai viralizar?”, mas sim: “essa música ainda vai importar daqui a cinco anos?” . O que estamos alimentando hoje nas plataformas molda o que ouviremos (e viveremos) no futuro. E se a resposta continuar sendo ditada por algoritmos e não por emoção, expressão ou verdade artística, talvez a música como a encontros esteja correndo mesmo perigo.
Valorizar a música vai além dos números. É sobre considerar que o que emociona, transforma. É tão recente que nascem fórmulas prontas.